O sol finalmente voltou a aparecer aqui em Singapura, após meses de poluição extrema que cobriu o céu da ilha e isolou as pessoas dentro de casa, de shoppings e escritórios. No último fim de semana, era só o que se ouvia nas ruas: o prazer de poder voltar a respirar ar puro e se bronzear na piscina. Aqui, como no resto do mundo, também se ignora aquilo que, de fato, deveria ser o centro das conversas: as queimadas na Indonésia que deram início a toda essa história.
Desde junho desse ano, milhares de quilômetros de florestas tropicais nas ilhas de Sumatra, Java, Borneo e Papua estão em chamas, espalhando sua fumaça tóxica por muitos países do sudeste asiático, inclusive Singapura, onde vivemos. Basta a direção do vento mudar para a paisagem - e a qualidade do ar - se transformare radicalmente, mesmo com o oceano nos separando dos focos de incêndio. E então, escolas fecham, parques ficam desérticos e máscaras desaparecem das prateleiras dos supermercados.
Especialistas já consideram esta a pior catástrofe ambiental do século XXI, mas a mídia internacional parece não se importar muito com a notícia. A fumaça proveniente dos incêndios pode ser avistada do espaço, mas aí no Brasil, minha família e meus amigos não têm ideia do que esteja acontecendo aqui na Ásia. Durante o Grande Prêmio de F1 de Singapura, em setembro, li algumas notícias em portais brasileiros sobre a nuvem de poluição que ameaçava a corrida, mas muito pouco sobre o que a causou em primeiro lugar.
Anualmente, quilômetros de floresta são intencionalmente incendiados para dar lugar à plantações que vão abastecer a insaciável demanda de óleo de palma da indústria de alimentos. Com os grandes conglomerados internacionais utilizando em grande escala o óleo vegetal proveniente das florestas tropicais da Indonésia em sua cadeia de produção, não é de se espantar que esse conflito de interesses silencie jornais e governos. As denúncias, infelizmente, ficam nas mãos de ativistas, cientistas e ONGs como a WWF, que divulgou uma lista completa de produtos que contém óleo de palma e explica porque seu consumo está destruindo habitats sensíveis em países tropicais. Já o site Rainforest Action Network, cita nominalmente as empresas que continuam financiando a destruição das florestas e também as que já começaram a mudar suas cadeias de produção em nome da preservação ambiental. Uma visita ao site mostra que gigantes como Unilever, Kraft e PepsiCo estão muito, mas muito mal na fita.
Enquanto o mundo inteiro ignora, florestas tropicais desaparecem do mapa. Apenas em Borneo, mais de 20 mil orangotangos estão ameaçados, assim como milhares de outras espécies de plantas e animais emblemáticos da região como tigres, rinocerontes e leopardos. Crianças e adultos sofrem com graves problemas respiratórios causados pela fumaça negra e mortes já estão sendo contabilizadas. Aqui em Singapura, o céu está azul e os parques seguem verdes como sempre. Mas nas ilhas vizinhas da Indonésia, a natureza segue ardendo em nome de uma economia global feroz e do suposto desenvolvimento do país.
E você aí no Brasil, que, ao ler este post, já começou a ajudar a causa se interessando e se informando sobre o assunto, espalhe esta notícia. Mas também preste atenção ao que vai parar no seu carrinho do supermercado. Você pode estar, sem saber, financiando a pior catástrofe ambiental do século.
Texto original publicado no HuffPost Brasil. Para ler outros textos nossos no portal, acesse.